quinta-feira, 7 de abril de 2011

Borboletas e Flores

(...) Continuar correndo e desviando das poças, mas levar um banho da água que os pneus dos carros atiram, inclementes, sobre pedestres incautos (...)

De cima da árvore, à espreita, a bela garça aguarda o momento que o peixeiro atira os restos de pescado no poluído rio que mais parece um valão, em Irajá...

Borboletas e Flores

Amigos!

Sayão é meu amigo. Ele tem mais de setenta anos e um jeito malandro na fala. Gosta de samba e de gente – é sabido que ele já ajudou muitas pessoas. Mas o que mais me impressiona no Sayão é o fato de ele conhecer meio-mundo. Seja no Centro, Tijuca, Zona Oeste ou Zona Sul; nos meandros dos bairros; nas sombras das amendoeiras, tem sempre alguém cumprimentando o Sayão... Só vendo para acreditar!

Embora o admire, não tenho a pretensão de ser tão popular quanto Sayão, mas graças à corrida, nesses últimos anos, o número de acenos que recebo cresceu enormemente. Enquanto treino pelo meu bairro e adentro nas ruas e ladeiras das adjacências, vejo gente e gente me vê. Vejo uma cidade que normalmente não veria, quando experimento trajetos alternativos e melhor utilizo todo espaço que o Rio me oferece. É incrível correr pelos subúrbios deparando com o lixo e a desordem de bairros que são apenas corredores de passagem, mas ao dobrar uma esquina, surpreender-se ao descobrir uma rua ou praça limpa e bem cuidada pelos próprios moradores que criam borboletas e flores em singelos canteiros – é quando a verde esperança não cintila apenas na grama bem aparada. E pensar que eu não conheceria tais recantos não fossem os diversos treinos que realizo.

... "Minhas filhas (as garças) já são mais de trinta" - diz o "pai" orgulhoso, ao mesmo tempo que limpa uma corvina: a curiosa cena foi registrada durante um de meus treinos pelo bairro.

Outras variações que surpreendem ocorrem em dias de tempo instável. Em um longão de duas horas, pode-se experimentar um vento frio aspergindo orvalho, em Irajá, às oito e trinta da manhã e, três quartos de hora depois, passando por Benfica, sentir o sol romper as nuvens e deitar seu calor de outono carioca, feito compressa, em nossos ombros suados – momento de tirar a camisa e prendê-la no short. Meia hora depois, já tendo feito a curva em Triagem e rumando de volta a Irajá, encarar uma tempestade diante do Shopping Nova América. Continuar correndo e desviando das poças, mas levar um banho da água que os pneus dos carros atiram, inclementes, sobre pedestres incautos. Se um atleta de rua deve ter bom humor para encarar qualquer tempo, correr é uma lição de vida. Superar a passagem da chuva e do sol. Deixar para trás não só poças d´águas e lixo, mas flores e borboletas, não faz do corredor um ser solitário, fá-lo livre e integrado no todo. Este ser passageiro leva consigo o próprio mundo onde os problemas não foram suficientes para fazê-lo parar. Leva um sorriso, um aceno, um incentivo para quem parou e deseja retornar ao movimento. É nessa hora que alguns corredores de personalidade introspectiva se revelam grandes comunicadores, feito meu amigo Sayão. Descobrem que sem o uso da palavra é possível comunicar-se, com os mundos externo e interno, através da linguagem do movimento.


Abraços!
Bira

2 comentários:

  1. Alessandro Alfinete8 de abril de 2011 às 10:11

    Bira Poeta, vc tava muito inspirado quando escreveu esse ultimo artigo. Ficou muito bom. Parabens, lindas palavras.

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  2. Muito bom amigo,parabéns pelo belissimo trabalho!

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