(...) O rosto de quem voa parece absorver a luminosidade do céu. Parece que uma parte de nós ficou lá em cima ou sempre esteve ali, nos esperando, para nos completar (...)
O medo tem medo de voar de trike. Foi isso que eu descobri logo nos primeiros instantes após decolar naquele ultraleve motorizado, pilotado pelo Guilherme, que partiu do Clube de Aeronáutica para ganhar os céus da Barra da Tijuca. Como sorvete que derrete ao tocar no céu da boca, meu medo de voar também se derreteu, naquele céu, e se converteu em calda doce, banhando a alma de fascínio, enquanto eu vislumbrava os diferentes tons de verde que colorem as lagoas e os morros da Zona Oeste. Se o barulho do motor foi abrandado pelo balanço do Rock Nacional, ouvido no headset a 300 metros de altura, o balanço do vento transformava nosso piloto num cavaleiro do ar. Com destreza, Guilherme angulava a barra de comando do trike para ganhar ou perder altitude, rodopiar ou fazer manobras. Abaixo, surgiu a extensa praia branco-areia, repleta de banhistas que pareciam formigas. Ao longe, a linha do horizonte era a fronteira entre os azuis do mar e do céu. A aeronave avançou sobre as águas e no meio de tanto azul nos sentíamos livres. Logo foi hora de perder altitude para voar rasante sobre as ondas, seguindo a curvatura da praia, para melhor perceber a velocidade do vento e a eletricidade do mar.
Guilherme Heusi explora o céu da Barra da Tijuca e faz careta para a foto. |
Cavaleiro do Ar
Amigos!O medo tem medo de voar de trike. Foi isso que eu descobri logo nos primeiros instantes após decolar naquele ultraleve motorizado, pilotado pelo Guilherme, que partiu do Clube de Aeronáutica para ganhar os céus da Barra da Tijuca. Como sorvete que derrete ao tocar no céu da boca, meu medo de voar também se derreteu, naquele céu, e se converteu em calda doce, banhando a alma de fascínio, enquanto eu vislumbrava os diferentes tons de verde que colorem as lagoas e os morros da Zona Oeste. Se o barulho do motor foi abrandado pelo balanço do Rock Nacional, ouvido no headset a 300 metros de altura, o balanço do vento transformava nosso piloto num cavaleiro do ar. Com destreza, Guilherme angulava a barra de comando do trike para ganhar ou perder altitude, rodopiar ou fazer manobras. Abaixo, surgiu a extensa praia branco-areia, repleta de banhistas que pareciam formigas. Ao longe, a linha do horizonte era a fronteira entre os azuis do mar e do céu. A aeronave avançou sobre as águas e no meio de tanto azul nos sentíamos livres. Logo foi hora de perder altitude para voar rasante sobre as ondas, seguindo a curvatura da praia, para melhor perceber a velocidade do vento e a eletricidade do mar.
Terminado o vôo, depois de pousar na pista de grama do aeroclube foi impossível não continuar sorrindo ou encontrar palavras que descrevessem a experiência. O rosto de quem voa parece absorver a luminosidade do céu. Parece que uma parte de nós ficou lá em cima ou sempre esteve ali, nos esperando, para nos completar. Deve ter sido essa a sensação de Guilherme Heusi, há 29 anos, quando começou a voar.
O Começo na Asa Delta
No início dos anos 80, o saudoso carioca Pepê sagrou-se campeão mundial de asa-delta no Japão. Enquanto as telas do cinema e da TV projetavam para o Brasil a imagem do Menino do Rio, cantada por Baby Consuelo e representada por André De Biase, em música e filme de mesmo nome, bastava ao Guilherme atravessar a rua ou abrir a janela para viver aquele sonho.
"Menino do Rio" na voz de Baby Consuelo ou na pele de André De Biase - símbolos dos anos 80.
Aos 19 anos, o morador de São Conrado que via do próprio quarto os homens-pássaros decolando decidiu aprender a voar. Comprou o livro “Vôo Livre para Você” e associou-se a um amigo paraguaio de mesmo propósito. Os dois nunca tinham saltado nem tinham nenhuma noção do que estavam fazendo quando partiram para Queimados, onde era possível dar saltos de até 30 metros de altura. Treinaram ali durante uma semana. Na seguinte, foram para Vargem Grande dar saltos de um morrote com 130 metros, onde tomou o primeiro susto:
— Foi num dia de vento forte e eu, que desconhecia as regras do vento ascendente, saltei assim mesmo. Enquanto minha intenção era ir para baixo, a asa só subia — conta.
Com apenas duas semanas de treinos, Guilherme encarou os 510 metros de altitude da rampa da Pedra Bonita, às seis da manhã, para um vôo perfeito e pouso na areia. “Fui reprimido pelos voadores antigos, pois estava sem instrutor” — lembra.
Perfeito também foi seu primeiro vôo duplo, em 1985, motivado pela insistência de uma turista brasiliense que lanchava em sua barraca de sanduíches situada ao lado da barraca do Pepê: “Se você voa sozinho, voa duplo também!” — argumentou a turista tentando convencê-lo a lavá-la. Casemiro, o único piloto de duplo da época, estava por perto e predispôs-se a orientar na decolagem. As condições para vôo duplo eram boas e deu tudo certo.
O Voo Mais Ousado
Quando decidiu ir morar em Genebra, em 1992, Guilherme era apenas mais um passageiro em seu vôo mais ousado. Queria “aprender francês e ganhar experiência” na Suíça. Para sobreviver, trabalhou de faxineiro, porteiro e pizzaiolo. Em seu primeiro emprego, como porteiro de um shopping, o pagamento era bimestral e o patrão desonesto. No primeiro bimestre alegou que não o pagaria, pois estava tentando legalizá-lo. No segundo, nem deu desculpas, disse que não pagaria nada e mandou Guilherme procurar a justiça para receber, pois perderia a causa e seria deportado. A chantagem daria certo com qualquer um, mas um homem que se atira das alturas não é um qualquer. Guilherme Heusi aceitou a “sugestão”, foi à justiça e ganhou — para desespero do patrão chantagista. O sobrenome de origem suíça garantiu sua presença naquele país, onde permaneceu por três anos.
Quando retornou ao Rio, em 95, pretendia passar três meses de férias. Alugou uma casa no Itanhagá, mas foi adiando o retorno até ficar de vez. Na Suíça deixou duas asas-delta, carro, moto, roupas...
Adrenalina: nos finais de semana, Guilherme conduz turistas e cariocas - como nosso amigo Roberto Andrade - para verem o Rio do mesmo ângulo que Deus observa Sua obra. |
Trike
Se a asa-delta proporciona um vôo incerto — rente às encostas e ao sabor do vento — que pousa na areia, o trike permite vôos longos, podendo atingir até 5.000 metros de altitude. Foi de trike que Guilherme e Georgeana, sua esposa, voaram para Paraty, Ubatuba, Angra entre outras cidades, desde 2007.
— Durante o vôo, tem hora que a gente canta junto a música que toca no headset e tem hora que simplesmente não falamos nada, nem precisamos — conta Georgeana com brilho nos olhos.
Quando concluímos essa matéria, no plano de vôo do casal estava o percurso Rio-Florianópolis, durante o carnaval. Não foi difícil imaginar a cena e se ver deitado na areia duma praia paradisíaca, na Ilha da Magia, e, de repente, ouvir um motor se aproximando lá no céu... Saltando detrás da encosta surge um pássaro de nylon, alumínio e gasolina onde batem dois corações super-humanos, completos e livres — ou presos no ar.
Abraço!
Bira.
Abraço!
Bira.
Bira, querido...
ResponderExcluirMe desculpe a intromissão, mas descobri seu blog e "devorei" algumas passagens, inclusive a que você fala do meu querido irmão. Adorei!
Fiquei encantada com todas as suas colocações e a única coisa que posso te dizer é que você merece toda a minha consideração..
Só escuto coisas maravilhosas a seu respeito e o conceito que tenho de você cresce a cada dia...
Por isso tomei a liberdade de escrever aqui.
Um beijo com carinho, muita admiração e respeito.
Isabela Heusi
Isabela; Obrigado pelo seu comentário e pelos elogios... Não há intromissão nenhuma: este espaço é para todos os leitores do blog - graças a Deus - em número crescente. Os comentários são sempre benvindos! Continue lendo as postagens e comentando quando quiser. Bjs! Bira
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