Blogueiros narcisos só falam das vitórias. Para mascarar meu narcisismo, no entanto, eu também conto os fracassos e então até pareço humilde - Lobo em pele de cordeiro! - diriam os inimigos. Sacana, debochado, pretensioso!... diriam os demais. Eu não digo nada, apenas escrevo para descansar das corridas...
Treinando para a Maratona de Porto Alegre
Quando os fogos espocaram no céu de Copacabana, era reveillion. Enquanto a multidão reeditava o ritual de abraços e boas-querências meu coração cintilava nas mesmas luzes e cores dos foguetes espanhóis.
Logo na primeira tarde do ano corri em ruas desérticas de um surbúbio em ressaca. Iniciava ali meus treinos para a Maratona de Porto Alegre (22/05/2011), atraído pelo slogan de "mais rápida do Brasil".
Quatro meses e meio depois, eu já tinha na bagagem mais de 1.100 km percorridos em treinos e três maus resultados em corridas mais curtas. "Tudo bem..." - pensava "meu foco é a maratona!" Bastaria fazê-la abaixo de 3:20h que nada mais importava. Até que o dia da corrida chegou!...
Jantar de Massas
O Clube dos Caixeiros Viajantes ficou lotado. Macarrão com tempero simples, salada e refrigerante estavam de bom tamanho na véspera da maratona. Ainda não tinha me enturmado quando a equipe dos Correios chegou trazendo, entre seus membros, Sandro, meu companheiro de treinos no Rio. Quem não deu as caras foi o Frio do Sul, bastou um leve casaco para proteger minha pele curtida de sol. Também não teve música no vasto salão. As pessoas comiam, falavam, tiravam fotos e depois íam embora.
largada da elite masculina
A Corrida
Vários despertadores tocaram às cinco da manhã. Os banhos foram breves assim como o café matinal. Uma hora depois, ainda era noite no estacionamento do Barra Shopping, local da largada. Logo o dia clareou revelando as cores do esporte. As mulheres largaram às 7h, cadeirantes às 7:10h e homens às 7:15h. O sol gaúcho também deu sua largada, no princípio, brilhando mais do que aquecendo. A Maratona começou!
Sorriso e otimismo no começo
Entre os dois mil corredores que se espalharam pela margem do Guaíba, mantive o ritmo de 4,43min por kilometro. Cruzei os 10k em 47min, a meia maratona em 1:40h e os 30k em 2:23h. Percebi a queda do ritmo quando comecei a ser ultrapassado a partir de então. Vi que não daria para reagir e triste, refiz minha meta: concluir a prova abaixo de 3:30h.
A Quebra
Por volta do Km34, meus pés doeram como se estivesse pisando em brasas. Caminhei uns duzentos metros e voltei a correr no braseiro para retornar a caminhar depois. Passei a mão no ombro e senti os cristais de sal, arranhando a pele como areia. O sal também permeava entre fino tecido da bermuda, formando manchas brancas. Por sorte, ou devido à musculação, não senti dores nos ombros. Quando voltei a "correr" fui ultrapassado por uma patricinha saltitante e não me conformei apertando o passo e deixando-a para trás. Esgotado, quase voltei a ser ultrapassado de novo pela moça que saltitava. Reagi, até que me vi, patético, disputando posição com a frágil criatura num ritmo de aproximadamente 6min por km (que vergonha!), desisti e caminhei de novo para ver a menina se distanciar com seu rabinho de cavalo louro e esvoaçante. Tanta gente mais me passou!... Magros, gordos, altos, baixos, novos, velhos... Voltei a trotar nos últimos 4 km e concluí em 4h a Maratona mais Rápida do Brasil.
Ainda foi possível sorrir no final
Após a prova eu só queria descansar mas não dava. Voltei às pressas para fechar a conta no hotel e logo fui para o aeroporto para não perder o voo. No avião senti dores nas pernas e tontura. Ingeri sal e bebi bastante água até melhorar. Cheguei em casa à noite e decretei que o ano havia acabado naquele 22 de maio. Fiquei no limbo entre o ano que acabou e o ano novo que só chega depois de dezembro, nas areias de Copacabana, ao espocar dos fogos espanhóis. Aos poucos, no entanto, percebi que no limbo não há o que fazer. Como posso despedir um ano e me situar no tempo que deixou de existir?
Últimos metros: me arrastando até o final. |
Trabalhei e malhei na segunda e terça-feiras. Na quarta, trotei 47 minutos para dissipar o lactato das pernas, trabalhei e malhei à noite. Por hora, desisti de fazer a Maratona do Rio, trocando-a por futuras meias-maratonas. Irritado, me nego a repetir a frase brega e surrada de um pagode sentimentalóide que diz: "Onde foi que eu errei?"... Que merda!
Abraços!
Bira