quarta-feira, 28 de março de 2012

Bolero de Ravel

Amigos;

Partindo do Leme, à tarde, a Maratona de 84 ainda teve o primor de um disparo de canhão seguido de um Bolero de Ravel, na largada (magnífico e inesquecível!) invadindo a alma e ativando ainda mais as emoções: foi suor e lágrimas.
  
 camiseta furadinha, faixa na cabeça e os canhotos que os corredores destacavam dos números de corridas e entregavam nos pontos de checagem: Geração Pré-Tech.

Quase chorei ouvindo o Bolero de Ravel. O ano era 1985, o local, Av. Atlântica, no Leme. Eu tinha apenas 25 anos, mas muita disposição e insanidade para acreditar que que poderia completar aquela maratona (42 km) sem ter feito nenhum preparo. Perdido entre as seis mil pessoas e a emoção da largada, sentia meu coração pulsar na intensidade daquela música. Naquele final de tarde, as sombras dos prédios cruzavam o asfalto em direção ao mar. Com tênis inadequados eu também pisava ali, de camiseta furadinha, como se usava naquele tempo. Durante o percurso da Maratona Atlântica Boavista - Jornal do Brasil, revezei entre correr e caminhar, para concluir a prova 5h e 28min depois.

Ainda nos anos 80, corri outra Maratona do Rio e uma Maratona de São Paulo. Sem saber o que era um treinamento adequado, usei apenas o combustível da juventude naquelas provas. Então tive problemas nos joelhos e cálculos renais - não deu para continuar. No dia em que desisti de correr sentei-me no sofá para aplicar gelo no joelho e liguei a TV. O gelo derreteu e eu fiquei ali parado por mais de 20 anos.

Como não dá para descrever essas mais de duas décadas (de 1987 a 2007) de sedentarismo, eu proponho que imaginemos esse tempo passando em slides, na tela daquela TV, na seguinte sequencia:

1- o estouro de champanhe no reiveillon de 87;
2- mulher abrindo presente de aniversário;
3- vai começar o show no Teatro Rival;
4- mãe esquentando mamadeira;
5- Alemanha é campeã na Itália;
6- ônibus na Av. Brasil;
7- domingo de sol;
8- ovelha Dolly nas primeiras páginas dos jornais;
9- beijo na boca;
10- família na Festa de São João;
11- flash back na Rádio Antena 1;
12- aviões derrubam Torres Gêmeas;
13- pai com os filhos no Maraca;
14- Lula veste faixa presidencial;
15- passeio em Macaé;
16- vestindo calça apertada;
17- Feliz 2007!
18- Levanta e desliga a TV!...

Lá em casa ninguém acreditou quando desliguei a TV e falei: "Vou voltar a correr!"

Era julho de 2007 e eu falava sério. Saí para o pique e, mais uma vez, os joelhos fizeram tudo para que eu desistisse. Decidi vencê-los. Malhei para reforçar a musculatura da coxa e corri na grama do Aterro para amenizar o impacto das passadas. Deu certo.


Em 2007, o mundo das corridas estava totalmente mudado: revistas especializadas, tênis para cada tipo de pisada, camisetas que não retêm suor, e sobretudo, muita informação. Aos 48 anos, lancei mão disso tudo. Se quisesse continuar correndo teria de fazê-lo não apenas com os pés, mas também com a cabeça. Em outubro de 2007 disputei corrida rústica nas Olimpíadas de Tribunais de Contas do Mercosul e conquistei medalha de prata. Em 2008, corri as principais provas de 10k onde obtive bons resultados em minha faixa etária. Este ano (2009) parti para a meia maratona e em 2010 concluirei uma maratona em 3h e 20min - acho que é só treinar.

E O QUE SE GANHA COM ISSO?

É comum ouvir alguém dizer que a atividade física traz bem-estar, saúde e disposição - uma verdade que de tão repetida passa a ser ignorada. Da mesma forma que é possível ignorar o nascer do sol ou uma lua imensa , flutuando no céu... Afinal de contas, amanhã o sol e a lua estarão ali de novo. Desse mesmo jeito, o bem-estar do esporte, pode ser - infelizmente - adiado para amanhã. Por hoje, bastaria o conforto do sofá e da TV... mas o tempo não espera!

Meu argumento é outro: Afirmo que reservar uma pequena parte do seu dia para caminhar ou correr, um momento só seu, vai além do físico e torna-se uma necessidade mental e espiritual. Na plenitude do ser, o bem-estar, saúde e disposição são apenas adendos.

Abraços!
Bira.

quarta-feira, 21 de março de 2012

E Murilo Parou de Fumar...

Amigos;

escrito em 2009...

foto do meu amigo Murilo: Um pote de balas na mesa substituía os cigarros. 

Seria apenas mais um cigarro que Murilo consumiria, não fosse a falta de ar que sentiu logo após a costumeira tragada. Voltava do almoço para o trabalho na Assessoria de Informática, e seus gestos automáticos de pinçar o cigarro entre os dedos para pô-lo na boca, foram interrompidos pelo susto. Amparou o peito com umas das mãos, ergueu a cabeça e tentou puxar o ar pelas narinas, mas era como se seus pulmões continuassem vazios. Naquela tarde de 24 de julho de 2000, Murilo atirou o maço de cigarros na cesta de lixo e comprou uma caixa de chicletes antifumo. Não mascou nenhum chiclete, mas foi pra casa dando pinta de que seria seu último dia como fumante. Na manhã seguinte, acordou bem disposto e, como se nada tivesse acontecido, foi para a varanda fumar mais um cigarro.

Aprendendo a Fumar

Murilo detestou, na primeira vez que colocou um cigarro na boca, aos 19 anos. Mas em 1966, o hábito de fumar era charme dos ícones de sucesso, atores e até desportistas. Aparentemente, 50% de seus amigos fumavam. Então como resistir? Anos depois, fumando em média um maço e meio por dia, deparou com um pulmão enegrecido de fumante exposto dentro de um recipiente de vidro, com formol, em pleno Largo da Carioca. Levou um susto que lhe rendeu três dias de abstinência.
Os problemas de saúde surgiram na década de 90. Dificuldade de respirar, baixa resistência e problemas de estômago. Foi nessa época que sua pressão atingiu 15/8, mas ele não associou ao cigarro.

As Tentativas

Em 1983 tentou parar diminuindo, mas não durou mais de um mês. Depois, passou a colocar o dinheiro dos cigarros em um cofrinho. Deu certo até que o cofrinho foi roubado: “Fiquei com raiva e comprei logo dois pacotes de cigarros!” – lembrou.
Entre 1990 e 1991, tentou parar em conjunto com a mulher, mas sempre que um cedia à tentação derrubava o outro.
Em 1997, a esposa parou após retornar à igreja. A pressão aumentou e Murilo já não fumava mais em casa, ou na sala do trabalho. Porém, quando podia, fumava de modo a compensar.

A Parada

Quando perguntei ao Murilo o que lhe fez parar de fumar, sua resposta foi lacônica: “O medo de morrer imediatamente.” Dez dias depois, ele me trouxe o complemento da resposta no texto de Raymond Chandler, do livro “A Irmãzinha”:

“O medo de hoje sempre se sobrepõe ao medo de amanhã. É uma verdade básica da psicologia dramática que a parte é mais importante que o todo. (...) Se o suspense e a ameaça não derrotassem a razão, haveria muito pouco drama no mundo”.

Dessa forma, foi Chandler quem explicou porque, no dia 26 de julho de 2000, 48 horas após ter sofrido aquele forte sufocamento, mais uma vez no retorno do almoço, Murilo sentiu um novo sufocamento, bem mais forte, e o medo imediato de morrer. Jogou o maço de cigarros no lixo, mascou os chicletes antifumo e nunca mais pôs um cigarro na boca. 


Abraços!
Bira.