Partindo do Leme, à tarde, a Maratona de 84 ainda teve o primor de um disparo de canhão seguido de um Bolero de Ravel, na largada (magnífico e inesquecível!) invadindo a alma e ativando ainda mais as emoções: foi suor e lágrimas.
camiseta furadinha, faixa na cabeça e os canhotos que os corredores destacavam dos números de corridas e entregavam nos pontos de checagem: Geração Pré-Tech.
Quase chorei ouvindo o Bolero de Ravel. O ano era 1985, o local, Av. Atlântica, no Leme. Eu tinha apenas 25 anos, mas muita disposição e insanidade para acreditar que que poderia completar aquela maratona (42 km) sem ter feito nenhum preparo. Perdido entre as seis mil pessoas e a emoção da largada, sentia meu coração pulsar na intensidade daquela música. Naquele final de tarde, as sombras dos prédios cruzavam o asfalto em direção ao mar. Com tênis inadequados eu também pisava ali, de camiseta furadinha, como se usava naquele tempo. Durante o percurso da Maratona Atlântica Boavista - Jornal do Brasil, revezei entre correr e caminhar, para concluir a prova 5h e 28min depois.
Como não dá para descrever essas mais de duas décadas (de 1987 a 2007) de sedentarismo, eu proponho que imaginemos esse tempo passando em slides, na tela daquela TV, na seguinte sequencia:
1- o estouro de champanhe no reiveillon de 87;
2- mulher abrindo presente de aniversário;
3- vai começar o show no Teatro Rival;
4- mãe esquentando mamadeira;
5- Alemanha é campeã na Itália;
6- ônibus na Av. Brasil;
7- domingo de sol;
8- ovelha Dolly nas primeiras páginas dos jornais;
9- beijo na boca;
10- família na Festa de São João;
11- flash back na Rádio Antena 1;
12- aviões derrubam Torres Gêmeas;
13- pai com os filhos no Maraca;
14- Lula veste faixa presidencial;
15- passeio em Macaé;
16- vestindo calça apertada;
17- Feliz 2007!
18- Levanta e desliga a TV!...
Lá em casa ninguém acreditou quando desliguei a TV e falei: "Vou voltar a correr!"
Era julho de 2007 e eu falava sério. Saí para o pique e, mais uma vez, os joelhos fizeram tudo para que eu desistisse. Decidi vencê-los. Malhei para reforçar a musculatura da coxa e corri na grama do Aterro para amenizar o impacto das passadas. Deu certo.
Em 2007, o mundo das corridas estava totalmente mudado: revistas especializadas, tênis para cada tipo de pisada, camisetas que não retêm suor, e sobretudo, muita informação. Aos 48 anos, lancei mão disso tudo. Se quisesse continuar correndo teria de fazê-lo não apenas com os pés, mas também com a cabeça. Em outubro de 2007 disputei corrida rústica nas Olimpíadas de Tribunais de Contas do Mercosul e conquistei medalha de prata. Em 2008, corri as principais provas de 10k onde obtive bons resultados em minha faixa etária. Este ano (2009) parti para a meia maratona e em 2010 concluirei uma maratona em 3h e 20min - acho que é só treinar.
E O QUE SE GANHA COM ISSO?
É comum ouvir alguém dizer que a atividade física traz bem-estar, saúde e disposição - uma verdade que de tão repetida passa a ser ignorada. Da mesma forma que é possível ignorar o nascer do sol ou uma lua imensa , flutuando no céu... Afinal de contas, amanhã o sol e a lua estarão ali de novo. Desse mesmo jeito, o bem-estar do esporte, pode ser - infelizmente - adiado para amanhã. Por hoje, bastaria o conforto do sofá e da TV... mas o tempo não espera!
Meu argumento é outro: Afirmo que reservar uma pequena parte do seu dia para caminhar ou correr, um momento só seu, vai além do físico e torna-se uma necessidade mental e espiritual. Na plenitude do ser, o bem-estar, saúde e disposição são apenas adendos.
Abraços!
Bira.