Gif animado com recorte de foto pessoal - Bira, 10-12-13. |
Correndo no Paraíso de um Momento X
Só sabia que ali tinha ar porque estava respirando: nenhuma gota de vento e rajadas de suor... Quarenta toneladas de sol faziam os poucos que passavam se afugentarem nas sombras. Apenas os ponteiros dos relógios trotavam como eu, eles nos arredores das onze da manhã e eu nas proximidades de Costa Barros. Fazia muito calor nos intestinos da cidade - desculpe falar assim, não me leve a mal - mas eu estava correndo nas fronteiras da cidade, a cerca 40 km de Copacabana, onde os carros e trens passavam rápido e um rio assoreado exalava chorume. Mais um pouco e chegaria à Baixada Fluminense. Antes, precisava encontrar um posto de gasolina com Gatorade e água gelada para beber, me banhar, abastecer, sobreviver e continuar.
Ao meu lado surgiu o muro alto e cinzento da estrada de ferro. Ele não produzia sombra, mas regurgitava sobre mim todo calor que bebeu, além disso, cobria grande parte da paisagem. Só soube que o trem passou, do outro lado, pelo seu barulho e vibração. Imagino que ele estivesse vazio e fosse passar em Nilópolis. Sorri e falei para ninguém ouvir: "Me espera lá que eu tô chegando!". Logo, surgiu um longo barranco com cerca de 20 metros de altura, na outra margem da estrada, e me fez lembrar as falésias das Praias de Pipa...
Foi há apenas três dias. Naquele mesmo horário e com aquele mesmo sol eu corri em Pipa descalço, vestindo apenas short e protetor solar. Nas areias paradisíacas, fui levado pelo silvo dos ventos. Quilômetros e horas passaram despercebidos enquanto meu olhar curioso empurrava o cansaço para a próxima praia do litoral potiguar. Se o calor aumentasse eu dissipava num mergulho. Eu não queria parar...
Logo voltei para o Rio e não quis correr nos seus belos lugares. Escolhi percorrer um roteiro desvalido em um dia escaldante. Com a memória ainda bem recente, eu quis comparar as sensações de correr em ambientes tão opostos e tirar disso uma lição. Independente das condições desfavoráveis eu sabia que chegaria o Momento X daquele treino e ele surgiu ali mesmo, em Costa Barros, enquanto eu filmava minha corrida. Ficou gravado; com as seguintes palavras tentei descrever o que ocorria:
- Eu estou num momento de extrema felicidade que "você" não consegue explicar... Vai ter gente dizendo que é a beta-endorfina... eu sei lá!... Eu só sei que é um momento de alegria, de prazer; independente da paisagem... A gente corre se sentindo feliz, se sentindo mais forte, se sentindo mais vivo!... Então não precisa nem explicar, né?... Simplesmente correr, saborear o momento que transforma a gente nesse ser corredor, nessa população que corre e que aumenta cada vez mais, graças a Deus!...
Agora que revejo a filmagem, percebo melhor que essa euforia não correspondia à ausência de beleza do local. Posso entender que naqueles segundos me despi do ego. Abandonei a ilusão do meu separatismo com relação ao local e deixei de ser crítico. Por instantes, o calor deixou de ser escaldante já que ele irradiava de mim. Desvali-me juntamente com o bairro e amparei-me num espaço sem limites. Fluí além dali e para dentro do todo. Percebi que Costa Barros e as praias de Pipa fazem parte de um mesmo paraíso que está dentro de mim e de tudo, que está na eternidade do Momento X.
Abraços!
Bira.
Que a vida seja feita de muitos momentos "X".
ResponderExcluirBons treinos Bira!
Drica Peixoto
http://correndonaviagem.blogspot.com.br/