Genivaldo atende e orienta aos atletas com primazia em sua loja no Rio. |
Genivaldo do Tênis
Amigos!Passava das 19 h e 30 min quando cheguei em frente à Loja de Tênis para entrevistar seu dono, Genivaldo Rosa (51). As grades da loja estavam semi-fechadas, mas era possível ver, através do blindex, que ele ainda atendia a uma menina acompanhada de seu suposto pai. Enquanto isso, me distraí na calçada assistindo o Brasileirão na TV do bar ao lado. Depois de fazer a última venda do dia, Genivaldo me convidou para entrar. De cara, pensei na primeira pergunta: "Genivaldo, como você arruma tempo para correr?", mas não era momento de fazê-la, estávamos nos acomodando. Abaixei o olhar para sentar-me num pufe e quando olhei para frente percebi Genivaldo com um álbum de fotos nas mãos, e foi logo mostrando uma delas:
-- Essa aqui foi do meu melhor tempo em maratonas, Belo Horizonte 1992, com 2:25 h.
Chegada de Genivaldo na Maratona de Belo Horizonte'92 - 2:25h - foto de arquivo pessoal. |
Genivaldo mostrou outras fotos de pódio e de excelentes chegadas, com naturalidade. Sua fala não possuía exclamações que denotariam um orgulho excessivo. Mas eu fiquei impressionado, não sabia que ele fora tão bom atleta... Quando decidi fazer esta postagem, queria relatar a história de um corredor comum, que uniu o útil ao agradável, aliando corrida e profissão. Genivaldo foi a primeira opção em minha mente - já que eu tinha acabado de comprar um tênis com ele - mas eu não conhecia sua história de corrida. Fui pego de surpresa.
Primeiros Passos no Comércio e na Corrida
As histórias de corrida de Genivaldo levariam toda a noite para serem contadas, mas a noite não era uma criança naquele momento. Então, perguntei por sua origem e como veio para o Rio. Ele respondeu:-- Nasci em 1963, em Lageado - PE. Com 11 anos de idade fui trabalhar em Arcoverde, cidade vizinha, como ajudante de vendedor de leite. Um ano depois, eu já era vendedor de leite, permanecendo até 15 anos de idade, quando ocorreu uma grande seca e migrei para São Paulo.
Em São Paulo, foi ajudante de bombeiro hidráulico e colocador de forro em residências até os 17 anos, quando veio para a capital fluminense.
-- Fui trabalhar em um haras no Jockey Club, já com 18 anos, quando conheci a corrida graças aos jóqueis. Eles precisavam correr para perder peso e me chamavam para ir junto. Era a época em que Joaquim Cruz se destacou e eu comecei a me interessar pelo esporte. Trabalhei no Jockey de 1981 a 1988.
-- E qual foi sua primeira corrida? - perguntei.
-- Foi a Volta da Lagoa de 84 ou 85... Vi uma faixa promovendo a corrida estendida na rua, fiz a inscrição e fui correr sem nenhuma técnica ou noção. Completei os 8 km em 28:59 min.
-- E o Genivaldo do Tênis ainda lembra do seu primeiro tênis de corrida, na época?
-- Claro que sim... Foi um Nike básico, em 1982... Era um tênis duro e o pior tênis de hoje seria melhor que os tênis daquela época. Daí que comecei a sofrer com as canelites...
O Pitangui do Tênis e O Atleta de Pódio
As canelites que seriam uma maldição para qualquer corredor, foram bênçãos para o futuro Pitangui do Tênis que começou a improvisar.-- Eu comecei a colar a base de sandália havaiana nas sola do meu tênis duro, para amortecer a pisada. O resultado não era esteticamente bonito, além de ficar pesado, mas curou minha canelite - contou.
Genivaldo não sabia, mas estava dando os primeiros passos como exímio reparador de tênis que se tornaria 10 anos depois.
Mesmo desprovido de orientação técnica, o corredor Genivaldo consegui bons resultados como 2:48 h nos 42 km e 1:12 h na meia-maratona. Chamou atenção de seu patrão, que também era dono do Curso de Inglês CCAA, e começou a patrociná-lo.
-- Parei de cuidar de cavalos e pude treinar. Foi quando ganhei técnica e surgiram meus melhores resultados. Fui 10º colocado no geral das maratonas do Rio'92, BH'92 e Brasília'93. Subi ao pódio em 5º na Maratona do Rio de 1993, com tempo de 2:26 h.
Genivaldo ergue o troféu de 5º colocado na Maratona do Rio'93 - foto de arquivo pessoal. |
-- Eu fazia reparos dos solados com borracha de pneu. Seguia o design original do produto e fiz sucesso entre os corredores. Eu já era do meio e isso também ajudava. Fui chamado de Pitangui do Tênis...
Naquela época havia oficinas de conserto de tênis. Esse serviço não sobreviveu muito tempo, pois não era possível atender em grande quantidade, a ponto de se poder manter uma loja. Aos poucos, no entanto, Genivaldo foi se tornando um consultor de tênis. Orientava atletas que lhe pediam dicas, e pensou: "Por que eu mesmo não vendo os tênis e ganho com isso, ao invés de apenas indicar?" Sem demora, começou a arrematar lotes promocionais de tênis para vender em grandes eventos, ou na própria casa onde ainda reparava os sapatos de corrida. Genivaldo estava se antecipando às mudanças, logo ninguém mais procuraria os reparadores de tênis.
Em 2002, Genivaldo propôs sociedade a amigos revendedores, como ele, na abertura da Loja de Tênis. Os amigos não toparam, mas ele seguiu em frente e abriu sua própria loja, obtendo sucesso.
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O tempo passou e Genivaldo não parou de correr e manter sua forma - foto de arquivo pessoal. |
Agora já são nove horas da noite e a Loja de Tênis continua iluminada. O bar ao lado, que espalha mesas na calçada, está lotado de gente assistindo ao Brasileirão. A noite ainda não é uma criança e eu preciso ir embora. Então é hora de fazer aquela pergunta que foi adiada assim que eu entrei na loja: "Genivaldo, como você arruma tempo para correr?", e ele responde:
-- Tive que comprar uma esteira onde treino duas vezes por semana. Complemento com um treino na rua aos domingos e outro durante a semana. Tenho um filho, o Matheus, 11, que tem necessidades especiais e não fica só em casa. Revezo com minha esposa nos cuidados ao menino, que já fez algumas caminhadas de 5 km! - exclama sorrindo, e continua: -- Ainda sinto a mesma paixão pela corrida! Às vésperas de uma prova pego no sono tarde e acordo antes do despertador. #
Já cinquentão, continua colhendo bons resultados - foto de arquivo pessoal. |
Abraço!
Bira.