sábado, 2 de julho de 2016

ACORJA - Os Amigos que Correm!

Cerca de 300 corredores formam a "Onda Azul", espalhando alegria pelas ruas do Recife e do Brasil...



Postagem com arquivo de áudio, permitindo maior acessibilidade. Se quiser apenas ouvir o texto, clique abaixo:

ACORJA - Os Amigos que Correm! (Audio-Post)

Amigos!

Alguns pequenos trotes de corridas matinais foram o suficiente para alimentar a esperança daquele cinquentão. Era abril de 2004, no Recife, e fazia poucos dias que Lula Holanda fora demitido do cargo de superintendente de uma multinacional. Esta posição lhe garantira ótimas condições de vida, mas, por outro lado, o sedentarismo também. Foi aí que baixou a depressão, emendando os dias em que ele nem queria sair de casa. Quando reagiu, foi caminhar no Parque da Jaqueira, onde logo arriscou seus primeiros trotes:

-- Até então, eu ia no parque vez ou outra para passear com a família. Nunca passou pela cabeça que eu me tornaria um corredor - explica.

Durou pouco para os primeiros trotes de Lula se acelerarem, naquela pista de 980 metros, e depois ganharem os 10 km de asfalto na famosa Corrida das Pontes do Recife. Era época de expansão dessas provas na cidade e Lula foi fisgado como um peixe: virou, de fato, um corredor! A depressão foi expelida em seu suor e evaporou ao gotejar no asfalto quente do Recife. Os dias de insegurança também se desfizeram e ele abriu sua própria empresa no ramo bancário, que já conhecia. Dessa vez, no entanto, Holanda não mais acomodaria seu físico, ou permaneceria parado feito os bancos do parque que tanto lhe inspirou...

-- Eu gostava de treinar ali e, ao longo de 2004, percebi um movimento cada vez maior de corredores... Mas o pessoal era meio tímido e não evoluía... Em 2005 juntei um grupo de amigos e fundamos a Acorja (Associação de Corredores do Parque da Jaqueira). Começamos a treinar, partindo sempre do Parque da Jaqueira para percorrer as ruas da cidade.

Lula Holanda orienta corredores antes de mais um treino pela ruas do Recife - foto de arquivo pessoal.

A Acorja e o Lula

Quando fundou a Acorja, Lula já planejava correr a sua primeira maratona (42 km). Tinha apenas uma dezena de meses na corrida, o que é muito pouco para alguém arriscar tal distância. Mas ele nem quis saber. Foi treinar com amigos da Polícia Militar de Pernambuco, visando a Maratona do Recife. Foram apenas três meses de preparação até julho de 2005. Lula, no entanto, tomou o cuidado de envolver seu sogro e dois filhos no apoio, durante o percurso, e relata:

-- Tudo ia bem até o quilômetro 32, quando eu cheguei à exaustão.  Sentei-me no chão, tirei os tênis e não quis mais seguir na prova. Lembro que um filho meu se aproximou dizendo: "pai, tenha calma, tenha calma...", mas eu tinha de fato decidido abandonar a prova... Foi quando passou um corredor muito acima do peso, praticamente se arrastando na corrida e isso mexeu com o meu orgulho. Repus os tênis e me levantei, dizendo para mim mesmo: "Agora eu vou!... E aquele cabra ali vai ser meu anjo!". O corredor obeso é conhecido como Paulo Picanha e hoje é mais um amigo que a corrida me presenteou.

Essa é apenas uma das inúmeras histórias de Lula, que 12 anos após seus primeiros trotes, traz no currículo 69 provas longas entre maratonas e ultra maratonas. A sua busca por participar de provas longas fez dele um expert no assunto, enquanto a Acorja se tornou uma Escola de Maratonistas, mas, na verdade, ela é muito mais que isso...

"Acorja é a Família que Eu Não Tive!"


A frase acima foi dita por Elias (nome fictício), 32, que há dois anos descobriu a Acorja, onde encontrou apoio para reforçar ainda mais uma decisão que já havia tomado: abandonar a maconha e o crack. Quando criança, Elias foi criado pela avó em meio à carência e adversidade. Namorou com o vício na adolescência e só conseguiu estancá-lo quando adulto, nos primeiros anos de paixão por sua esposa. Depois recaiu e se afundou, ao ponto de perambular por três dias nas ruas. Quando chegou neste ponto, teve o desejo de parar de se drogar. Procurou um amigo que fora adicto e havia se recuperado em uma clínica da Igreja Episcopal. Foi apresentado por ele ao pastor e começou seu tratamento. Deteve o vício, mas sentiu necessidade de praticar esporte para "ocupar a mente", complementando a terapia. Lembrou que tinha um par de tênis e começou a correr sozinho, por um tempo, até que outro amigo lhe levou para a Acorja. Ficou surpreso com todo apoio que recebeu daqueles novos amigos e disse:

-- Recebi bastante conselhos de fisioterapeutas, de psicólogos que também correm lá. Procurei dar o meu melhor, para fazer por merecer tanto acolhimento... - e completa: -- Quando eu não tenho tempo para ir treinar, sinto falta e quando chego naquele lugar me sinto renovado... A Acorja é a família que eu nunca tive!

Outro exemplo de recuperação foi relatado por João, 37, que consumiu drogas (maconha, cocaína e álcool) durante 15 anos. Tudo começou quando ele tinha 14 anos e se agravou aos 20, quando cursava  a faculdade. Seu cotidiano de sofrimento se estendeu até 2008, ano que conheceu sua esposa. A moça participava de um grupo de oração da Igreja Católica e lhe levou para as reuniões. Funcionou, e no final de 2009, durante um encontro de jovens, João foi chamado diante do público e da família para dar seu testemunho de recuperação.

-- Hoje, o que me cura é falar da minha história para outras pessoas. É como se eu tivesse tomando um remédio... Quanto mais eu conto, mais me fortaleço! - explica.

Longe das drogas, João começou a ganhar peso, em 2010. Reagiu correndo por conta própria, durante três anos, no mesmo Parque da Jaqueira que abriga a Acorja. Olhava aquela turma animada, vestida de azul, mas não se aproximava. Até que, em dezembro de 2015, encontrou uma amiga no parque que lhe apresentou aos corredores azuis. Foi acolhido e "matriculado" na Escola de Maratonistas e não durou quatro meses para participar de sua primeira maratona - a Maratona das Prais de Recife e conta:

-- Foi quando eu cheguei ao quilômetro 35 que senti demais o esforço... Mas eu precisava chegar! A chegada seria como um carimbo para selar minha recuperação espiritual e física. Consegui forças para prosseguir ao pensar na minha mulher e meus filhos. Cruzei a linha de chegada com a filha de um aninho nos braços!... - e complementa: -- Chorei muito pensando na mudança de vida, na família e tantos amigos que ganhei!

Acorjeanos pintaram bigodes de azul na última edição da maratona Maurício de Nassau - Lula em pé, no centro da foto.

A Comrades do Nordeste

Nem Recife, nem Pernambuco, tampouco o Brasil com seus 8,5 milhões de metros quadrados foram suficientes para aplacar o desejo de Lula em fazer grandes provas. Em 2010, ele foi encarar a Comrades - a ultra maratona mais famosa do mundo - na África do Sul. Completou seu duríssimo percurso de 89 km e conquistou sua cobiçada medalha. Quando retornou ao Recife, mais do que uma medalha Holanda tinha uma ideia para exibir à sua equipe: Projetar a Ultra Maratona 100 km do Frio - de Caruaru a Garanhuns, passando por cidades serranas de pernambuco, cuja altimetria se assemelha à da famosa Comrades.

Em 2012, o sonho foi realizado com apenas 13 atletas que encararam os 100 km de serra. Esse número foi multiplicado, até 2015, onde 238 corredores participaram. Para aumentar o número de participantes, foram criadas as categorias de dupla e quarteto. Esse ano, em virtude das olimpíadas, o evento foi transferido para 22 de outubro de 2016 e Lula prevê a presença de 300 corredores. A Polícia Rodoviária Federal coopera protegendo os atletas ao longo das BRs 232 e 423. Os patrocinadores também chegaram. Lula sabe a dimensão que a prova terá em futuro próximo. Ele já imagina as BRs fechadas para a passagem da prova, como ocorre na Comrades e afirma:

-- É sonho, mas será realidade! # # #

LEIA TAMBÉM:

Vannucci, Filma eu! - a história do maratonista e You tuber Vannucci Jr, do Blog Corrida Rústica.

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Abraços!

Bira.



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