Correndo pelas Crianças (Antônio, Boca e Coração - Parte II)

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Amigos!

E Antônio Carlos retornou ao cemitério para correr todas as madrugadas. Quando lhe restavam apenas 15 dias de aluguel pago, desesperado e ainda sem trabalho, foi caminhar pelo Centro de Roma. Parou próximo à Embaixada do Brasil e entrou num bar, reduto de brasileiros que residiam na capital italiana. Ali conheceu Brandão, mineiro de Governador Valadares, para quem expôs sua sorte. O pedreiro Brandão anotou seu telefone e disse:

- Estou para pegar um serviço entre hoje e amanhã. Assim que confirmar eu te ligo, pois vou precisar de ajudante.

Antônio encheu-se de esperança e, naquela noite, nem precisou resgatar o sono correndo pelo campo das almas. Seu coração verdejava depois de muito tempo e quando acordou, na manhã, foi realçar esse verde caminhando sobre a grama e entre as árvores de Villa Pamphilj. No imenso Parque, viu uma grande concentração de atletas preparando-se para uma competição. Seus olhos brilharam e suas pernas foram atraídas para o local. Sua boca ousada pronunciou, em péssimo italiano um pedido de participação na corrida, que foi aceito. Sem nenhum preparo específico além dos recentes treinos na madrugada, o brasileiro correu e chegou na terceira colocação.

Diz a frase que "Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar"... Sendo assim, o mesmo raio que em 1982 transformou Antônio em corredor da Santista, voltou a cair onze anos depois, em Roma: Impressionado pelo seu bom desempenho, Claudio Santini - vice-presidente da Roma Sprint - o convidou para integrar aquela equipe de corrida.

As coisas clarearam de vez dois dias depois, quando o pedreiro Brandão lhe ligou e, além de trabalho, conseguiu uma outra casa, onde Antônio dividiria o aluguel com moradores que não usavam drogas ou se embriagavam. Permaneceu trabalhando com Brandão até que Stephano Amadei, presidente da Roma Sprint e empresário da construção, o empregou.

- Foi aí que juntei o útil ao agradável - relatou Antônio - Voltei a ser atleta de ponta e transformei todas as premiações que ganhava em material esportivo, que enviava para a ACORP - aquela equipe que eu havia fundado em João Monlevade, pouco antes de ir para a Itália - explicou.


Corridas foram organizadas pela ACORP-Roma, na Itália, em prol das crianças de São José do Goiabal.



BOCA E CORAÇÃO

"Quem tem boca vai a Roma" e quem tem coração volta a Minas!... Assim que pôde, em 1995, o atleta voltou ao Brasil. Primeiramente para uma passar um mês e logo retornar - ainda não dava para ser diferente. Trouxe dentro de si o marido, o pai, o filho e o irmão - todos mortos de saudade, mas repletos de esperança. Trouxe também o amigo e patrono dos jovens corredores de João Monlevade. Com ele, veio o espírito de um mineiro aventureiro, que sai do interior em busca de oportunidade, mas que sonha um dia envelhecer na tranquilidade incrustada nos vales de sua terra. O mineiro que sonha jazer seu corpo, depois de velho e exaurido, no repouso infinito de um monte santo onde Padre Ermelindo faz minar, em seu túmulo, a água que cura, em São José do Goiabal.

A 192 km de Belo Horizonte, São José do Goiabal possui menos de 6 mil habitantes. Antes de chegar ali, pela BR 262, passa-se em João Molenvade com população doze vezes maior.


Dois anos depois, em 1997, retornou ao Brasil para levar esposa e filho pra Itália.

- Infelizmente, eu perdi quatro anos da infância de meu filho - lamenta, embora saiba que não teria outro jeito.

Assistido à distância, o grupo de corredores de João Monlevade continuou crescendo, até agregar 80 jovens e crianças, em 2003. Apesar de seu sucesso na Itália, ficou difícil mantê-lo sozinho. Bem relacionado, o brasileiro agregou italianos para fundar a ACORP-Roma - que recolhia material esportivo para enviar ao Brasil.

Visitando o Brasil, em 2004, Antônio Carlos fundou a terceira ACORP, em São José do Goiabal, cidade em que nasceu. Com menos de 6.000 habitantes, Goiabal não tinha nenhuma cultura esportiva, mas muitas crianças carentes. Comprou um terreno para a sede e tem planos bem maiores que as aspirações daquela humilde cidade: oferecer atividades complementares à sala de aula... Esporte, ambulatório pediátrico, refeitório e etc.

Em 2005, transformou a ACORP-Roma em ONG para possibilitar a adoção à distância, onde seus amigos italianos enviam 30  mensais para cada criança adotada, em Goiabal.

Em 2007, trouxe o amigo Giuseppe Giampadi e mais dois italianos ao Brasil para conhecer as crianças adotadas, o terreno e o projeto ACORP-Goiabal.

Em 2009, a irmã de Giuseppe se casou, em Roma, e não quis presentes. Aos invés disso pediu aos convidados da cerimônia que fizessem doações para iniciar a construção da sede da ACORP-Goiabal. Foram recolhidos 2.400  e a construção da sede começou no ano seguinte.

Em 2011, trouxe 10 italianos para conhecer o Brasil, ver de perto a construção da sede e participar com as crianças da Corrida de São José do Goiabal. 

Esse ano, não me lembro exatamente como, Antônio me convidou via Facebook para conhecer o seu trabalho, e participar da terceira edição da corrida. Abri mão da Meia Maratona do Rio, mas valeu à pena!... Aos 50 anos, Antônio Carlos de Carvalho não é apenas um dos atletas mais fortes na sua categoria, correndo 10 km em 36:08 min. Ele é um visionário e seus sonhos hão de se erguer bem acima dos montes que margeiam São José do Goiabal!

Continua na Parte III (final) - Reportando a corrida deste ano, em Goiabal...

- Link para conferir as três postagens desta série Antônio, Boca e Coração!: 
http://www.birananet.com/search/label/Antonio%20-%20Boca%20e%20Cora%C3%A7%C3%A3o









Abraços!
Bira.
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